“O que faz a esperança um
prazer tão intenso é que o futuro, que está à nossa disposição, nos surge ao
mesmo tempo sob uma imensidão de formas, igualmente risonhas, igualmente
possíveis” Henri Bergson, “Ensaio
Sobre os Dados Imediatos da Consciência”.
Txxxxxx! Era o barulho do
interbairros II fechando suas portas, enquanto um jovem de cabeleira esquisita
e envolto por várias jaquetas descia do ‘’bonde’’. Esse moleque pimpão parecia
ter um destino, em sua mente borbulhavam expectativas de uma festa que
ocorreria, era na casa d’um tal de alemão, mas antes ele teria que descobrir
como chegar lá. Estava bem escuro na Rua João Schledler Sobrinho com a Rua dos
Dominicanos, logo ali, na fronteira entre a área comercial e residencial do Boa
Vista. O menino parecia um tanto perdido e insanamente tresloucado para
atravessar as ruas. Enquanto o ruído de uma motocicleta acontecia, o jovem
perguntava numa confeitaria como chegaria ao endereço desejado.
Muito ingênuo não? No meio
daqueles corredores tortuosos boavistianos, surpresas obscuras o esperavam, ele
procurava uma rua com a parte do nome final: Geronasso. Mas não era assim como
a vida funcionava, ele percebera que todos os finais, de pelo menos 10 ruas da
região, terminavam com esse sobrenome. Era uma pena, a neblina acobertava os
possíveis assaltantes e outros tipos de seres que podiam estar esperando na
surdina. Até que após algumas ligações um tanto frenéticas, ele descobrira que
estava no começo da rua desejada. A ansiedade tomava conta de seu olhar,
enquanto suas pernas faziam um tênue ziguezague, quem estaria no alemão, será
que já tinha começado? Ele não sabia mais quanto tempo estava ali, a bateria
tinha acabado alguns minutos atrás. Soltou agora uma frase, murmurando
baixinho:
- Estou chegando, é no
número 503, e estou no 400.
Mal ele sabia que ao chegar
no número 450, os números começavam a baixar. Agora no momento em que
caminhava, pensava no que acontecera mais cedo, um misto de tristeza e
incapacidade que não queria que ninguém soubesse: o ato de simplesmente falhar como ser humano,
e desapontar a si mesmo, mas ele persistiria, lembrava o quão duro tinha dado
para chegar ali, a respiração se tornava intensa. Bufava agora, elogios
descarnados a sua má sorte, reclamando da vida. Já bastava aquele maldito
infortúnio que passara no mesmo dia, maldito seria aquele empata foda que
acabara com seus planos juanísticos naquela tarde. Um raio caiu.
Foi aí que parei de me ver,
era como se Michael Douglas estivesse assistindo “Um Dia de Fúria” em sua
própria televisão. Voltei a minha consciência de gafanhoto, não percebi que a rua
foi ficando mais estreita, tudo foi ficando mais claro, a neblina se dissipara,
contrastando com a luz da Lua que agora pairava. Os números foram subindo, até
que enfim achei meu destino, um belo sobradinho, com meus amigos esperando em
frente à porta. Foi aí que houve aquele amplo sorriso, brilhando numa garrafa
de Balalaika.
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